Obs.:
Reproduzido de www.cultura.gov.br,
acessado em 04/07/2016.
Por
Mônica Bidese
A
mais antiga ferramenta de incentivo à produção cultural do Brasil, a Lei
Rouanet, é alvo de crítica, especialmente no que diz respeito à renúncia
fiscal. Entretanto, projeção da Receita Federal aponta que, em 2016, apenas
0,66% dos cerca de R$ 270 bilhões que o Brasil deixará de arrecadar em
impostos, ou seja, cerca de R$ 1,8 bilhão, se refere à área cultural. E apenas
0,48% (cerca de R$ 1,3 bilhão) tem relação com a lei de incentivo à cultura.
O
percentual de renúncia fiscal na área cultural mostra-se ainda menor se
comparado a outros setores da economia. Só com o setor de comércio e serviços,
a União abrirá mão de cerca de R$ 77,4 bilhões (28,55% do total). Com a área
industrial, serão mais de R$ 32,2 bilhões, o que corresponde a 11,89% do total.
Mesmo com o pouco recurso destinado à produção cultural, ao longo dos 25 anos
da Lei Rouanet, 47 mil projetos captaram recursos, totalizando R$ 15 bilhões em
incentivos.
Os
benefícios fiscais concedidos a setores da economia são uma forma de fomentar a
atividade. No caso da Cultura, o mecanismo da desoneração possibilita que
cidadãos (pessoa física) e empresas (pessoa jurídica) apliquem parte do Importo
de Renda devido em ações culturais. Todo esse volume de operações ajuda a
aquecer o mercado e a demanda por produtos e serviços.
Ninguém
discute que saúde e educação sejam prioridades na administração pública. No
entanto, é preciso deixar claro que o orçamento da União já garante os
percentuais de recursos destinados a essas áreas. Portanto, dizer que a renúncia
fiscal em favor do incentivo à cultura retira dinheiro da saúde e educação é um
equívoco.
Na
avaliação do professor e coordenador do Centro de Trabalho de Economia
Criativa, Cultura e Desenvolvimento da Universidade Federal do Rio Grande do
Sul (Ufrgs), Leandro Valiati, a questão não é o instrumento de renúncia fiscal,
mas como lançar mão dele junto com outros importantes instrumentos de
financiamento da cultura. "Acredito, sobretudo, na necessidade de criar um
novo sistema de subsídio. Não precisamos acabar com a Rouanet, mas
transformá-la em parte desse sistema maior. A lei precisa ser pensada com
estrutura diferente", ressalta. Valiati identifica no apoio à cultura não
apenas uma estratégia de desenvolvimento social, mas também de transbordamento
para outros setores da economia.
Apenas
em 2015, por exemplo, foram apresentadas 8.782 propostas culturais, das quais
6.194 foram convertidas em projetos. Desses projetos aceitos, 5.451 foram
aprovados e autorizados a captar recursos, sendo que 3.147 obtiveram êxito na
captação. Isso resultou em mais de R$ 1,1 bilhão destinado ao apoio à cultura,
o que reverteu em geração de empregos, renda e no desenvolvimento da cadeia
produtiva da cultura (serviços especializados e abertura de espaços para novos
profissionais ingressarem no mercado).
Impacto
na economia
Se
for levado em conta o volume de operações ao longo dos 25 anos da Lei Rouanet,
foram apresentados mais de 121 mil projetos ao mecanismo de Incentivo a
Projetos Culturais do Pronac (Incentivo Fiscal / Mecenato), dos quais mais de
107 mil foram aprovados e cerca de 47 mil captaram aproximadamente R$ 15
bilhões em recursos. Mais de 110 mil proponentes acessaram o mecanismo e cerca
de 67 mil investidores destinaram recursos para apoiar projetos
culturais.
"A
cultura é importante não apenas como estratégia de desenvolvimento, mas também
de transbordo para outros setores da economia", destaca o pesquisador do
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Bruno de Araújo. Ele reconhece
que o País teve políticas culturais importantes nas últimas décadas, mesmo com
recursos escassos, mas avalia que há muito para ser feito. "Temos
potencial enorme para crescer, sobretudo no exterior, e quando isso ocorrer,
vai carregar os produtos brasileiros para fora", ressaltou.
Outro
dado importante e que mostra a abrangência da distribuição da renúncia fiscal
por categoria no último ano é verificado nos projetos admitidos por área no ano
passado. Artes Cênicas lidera a captação, seguida por artes visuais,
audiovisual, humanidades e música.
Captação
de recursos recua
Devido
às sucessivas críticas à Lei Rouanet, em 2015, o MinC verificou queda
expressiva da captação de recursos. O movimento sinaliza um arrefecimento do
mecanismo de parceria entre empresas e o setor cultural. Segundo a Secretaria
de Fomento e Incentivo à Cultura do Ministério, ocorre um distanciamento dos
patrocinadores na utilização do instrumento pela possibilidade de repercussão
negativas para as marcas.
O
governo reconhece a necessidade de ajustes na Lei para corrigir distorções, mas
o ministro Marcelo Calero entende que, na atual conjuntura econômica, uma
investigação por meio de Comissão Parlamentar de Inquérito é inoportuna e
poderá causar prejuízos para o setor cultural, que já sofre com a queda de
renda e trabalho. "Parece-nos mais oportuna a mobilização do Congresso
para a modernização da lei, de maneira que sejam corrigidas as distorções, do
que a abertura de investigação", destacou.